WendyAndrade

Cada Cabeça É Um Mundo

Olha.
Meu tio Renato decidiu sair de casa.
Sem motivo aparente.
Deixou minha tia.
Meus primos.
E no auge dos 60 anos.
Foi embora.
Já dava aula no interior do Rio.
Alugou uma casinha no meio do mato.
E por lá ficou.
A família achou um absurdo.
Minha tia puta da vida disse.
Renato não é mais um garoto para essas aventuras.
Mas lá foi ele.
Sempre sorrindo.
Feliz.
Do jeito que ele é.
Mesmo longe.
Não deixava faltar nada.
Todo mês aparecia.
Pagava todas as contas.
E voltava para o mato.
E daí.
Fiquei pensando.
Faltou uma conversa sincera com Renato.
Sem histeria.
Sem agressão verbal.
Um bate papo na boa.
No amor.
Já que a gente perde a oportunidade de ser melhor com o outro.
Muitas vezes por não ouvi-lo.
Ontem.
Um rapaz com pressa.
Subiu na escada rolante.
Pediu licença para uma senhora.
E ela não cedeu.
Ele gritou.
Ela não cedeu.
Foi quando ele decidiu empurrá-la.
Por sorte.
Eu e um rapaz a seguramos.
Bem na hora.
Ela só machucou o braço.
Mas poderia ter sido algo pior.
O rapaz no auge da sua pressa.
Não percebeu que a senhora era surda.
Ela não ouve.
Aqui na esquina de casa.
Um carro avançou o sinal.
Achei um absurdo.
As senhorinhas bradavam contra o carro.
E lá na frente o carro foi parado pela polícia.
E o rapaz que dirigia.
Aflito.
Apontava para sua esposa no banco de trás.
Grávida.
Prestes a ter neném.
Mas.
Voltando ao meu tio.
Ele morreu.
Estava passeando com seus alunos numa trilha.
Sentiu uma dor.
E morreu.
Mas antes de ir.
Ele deixou uma cartinha para família.
Dizendo que tinha descoberto uma doença muito grave.
E não queria dar trabalho.
Não queria que a doença dele impedisse os filhos de ter uma vida plena.
E que não impedisse a mulher que ele mais amou na vida de ser feliz.
Não sei se ele está certo.
Ou errado.
Mas às vezes é melhor perguntar.
Cada cabeça é um mundo.

Política É Amar