Todo Menino É Um Mar

Alguém precisa sentir.

Isso foi a primeira coisa que pensei em meados de 2014, sentado na praia observando as crianças brincando no mar. De uma forma quase inconsciente, comecei a fotografar e quando vi, eu tinha mergulhado em mim.

E esse mergulho foi tão profundo que os mares se juntaram, se fizeram oceano, atravessei a Baía de Guanabara até a Baía de Todos os Santos. Durante 6 anos, nesse processo de descoberta, fiz o trajeto do navio negreiro e vi o quanto o mar era um lugar de dor. E na Gamboa, eu senti que esse meu desejo incontrolável de fotografar os meninos no mar era um convite a ressignificar.

No Arpoador matavam as baleias, na Gamboa chegam os escravos, na Ribeira largavam os humildes, São Tomé de Paripe moravam meus ancestrais. Hoje, os meninos que saltam no mar de frente para a linha do horizonte não têm medo. Eles são a verdadeira realeza, como cantava Roberto Ribeiro: todo menino é um rei.

Agora, o lugar onde a água encontra a terra é um lugar do amor que encontra o amor, sem dor. E esses meninos, pretos, retintos, que se banham felizes à beira do mar não estão preocupados com o que virá. Eles só se permitem ao acaso de um salto perfeito, conscientes que o mar não foi feito, ele se fez. Então, há respeito mas não há pressa, um menino pulando no mar é um menino voltando pra casa.

Nossos ancestrais fizeram das tripas coração para essas crianças só serem coração. Por acaso ou beleza de vontade, só sentir. Isso vai muito além de mim, vai muito além das crianças, vai muito além de você que está lendo esse texto.

A vida é grande e a gente pouco sabe dela.

E, hoje, a água e sal que simbolizam a partida e chegada, através dessas crianças se descobre um novo jeito, um novo sabor, talvez doce, que é de estar. Ninguém chega e ninguém vai, todo mundo é daqui e aqui é o meu lugar.

Olha, criança sabe com o corpo, então te convido a apreciar a minha série de fotos “Todo Menino é um Mar". Até porque alguém precisa sentir.

Axé.